9.7.10

TRAGAM-ME A CABEÇA DE ALFREDO GARCIA (Bring me the Head of Alfredo Garcia, 1974), de Sam Peckinpah

A distribuidora LUME já ganhou o meu respeito. Lançou recentemente em DVD CRASH, do Cronenberg, e agora vem com TRAGAM-ME A CABEÇA DE ALFREDO GARCIA, a obra prima de Sam Peckinpah e um dos meus filmes favoritos de todos os tempos! E se preparem que vem mais por aí do diretor: o belo western PAT GARRET E BILLY THE KID e o subestimado THE KILLER ELITE. Ainda não tive tempo de colocar pra rodar o DVD de ALFREDO GARCIA, chegou ontem, mas vale a pena relembrar alguns detalhes memoráveis que tornam essa preciosidade uma das razões de existir uma tal arte chamada cinema!

A história de ALFREDO GARCIA começa bem antes das suas filmagens, com seu realizador se tornando famoso, não pelas obras que produzia, mas por um pequeno pormenor envolvendo álcool em excesso e problemas com executivos dos grandes estúdios. Acabou que ninguém mais queria investir numa produção que estivesse nas mãos do diretor maluco beberrão irresponsável. Como todo bom bandido de faroeste, partiu para o México onde realizou este que é o filme mais subversivo, melancólico e visceral de sua filmografia.

Foi no próprio diretor que Warren Oates se inspirou para compor o protagonista, Benny, um pianista americano frustrado que chegou ao fundo do poço numa cidadezinha mexicana e passa as noites tocando um órgão de bar para alegrar turistas. Mas a nossa trama começa em outro cenário, nas terras de um poderoso fazendeiro mexicano que descobre que Alfredo Garcia, um de seus empregados de confiança (que considerava um filho), engravidou sua filha. Puto da vida, o sujeito resolve dar uma gorda recompensa a quem trouxer, vivo ou morto, o pai da criança.

Aí que entra Benny. Em uma noite como outra qualquer, enchendo a cara e tocando alguns sucessos, como Guantanamera, em seu piano no bar, chega até ele um “casalzinho” de senhores arrumados, cabelinhos bem penteados, vestindo blazers com um grau de chiqueza acima do comum e oferecem a Benny uma quantia em dinheiro para que ele encontre Alfredo Garcia sem fazer muitas perguntas. Na situação em que se encontrava, acho que Benny venderia a própria mãe.

Contando com a ajuda da prostituta Elita (por quem o sujeito tem uma atração que vai além dos serviços que ela presta), que sabe do paradeiro de Alfredo Garcia, Benny aceita a missão e parte nessa jornada niilista pelo território mexicano em busca do pobre coitado (que já está morto e enterrado!). E a tensão só vai aumentando à medida que a viagem do casal se transforma num verdadeiro inferno. Após conseguir a cabeça do procurado, com direito a profanação de cova, Benny precisa retornar e não são apenas os caçadores de recompensas que querem botar as mãos no utensílio de Alfredo, mas também a família do pobre infeliz. Benny defende seu apetrecho com unhas e dentes.

Quanto mais ele mata, mais a loucura toma conta do personagem cujo desempenho de Warren Oates está em estado de graça! As cenas em que Benny dirige pelas estradas conversando e resmungando com a cabeça ao seu lado, dentro de um saco rodeado de moscas, além de impagáveis, demonstram todo estado de espírito de um personagem completamente perdido em seus atos!

Quando a violência finalmente explode de uma vez, o impacto é grande. É praticamente impossível desgrudar os olhos da tela. É aí que o diretor se sente mais à vontade para utilizar todos os artifícios pelo qual ganhou notoriedade: tiroteios em câmera lenta, derramamento de sangue e uma edição ousada que cria um resultado estranhamente belo. Não é à toa o apelido de “poeta da violência”.

Temos aqui o que há de melhor no cinema de ação peckinpaniano. Difícil um fã de cinema de ação não ser também admirador do trabalho de Sam Peckinpah. O sujeito praticamente reinventou o gênero com seus westerns e filmes de ação violentíssimos. Mas em ALFREDO GARCIA temos nas entrelinhas o que há de mais pessoal e circunstancial para Peckinpah naquela época. Não era apenas com uma puta direção de tiroteios em câmera lenta ou perseguições de carros alucinantes que ele fisga seu público, ele sabia exatamente como expressar todas suas frustrações, desilusões e visão de mundo com uma câmera. Se tratando então de Peckinpah, esse universo diegético pessimista deixa um estrago considerável.


15 comentários:

  1. O THE KILLER ELITE é bom mesmo? É dos poucos Peckinpah que ainda assisti, cedo ou tarde acabarei vendo, mas confesso que tenho preguiça.

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  2. Olha, é meio complicado, Vlademir, nem todo mundo gosta. Já eu acho um filmaço! James Caan lutando contra ninjas num filme de Sam Peckinpah?! Não pode ser ruim!!!

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  3. Já comprei "The Killer Elite". Adorei as capas.

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  4. Ronald entende das coisas. E "visceral" é mesmo a palavra. Sobre Peckinpah e Oates já cansei de dizer o quanto venero (maiores do cinema americano!).

    E vou providenciar The Killer Elite pra já, falta esse e o Casal Osterman pra mim. Convoy você não viu né? Diferente de quase todo mundo, eu achei filmão também.

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  5. Pois é, nao vi Convoy ainda. :(

    Na verdade, falta um bocado de coisa ainda pra eu fechar a filmografia do Peckinpah: Jinxed, Convoy, Junior Bonner, Major Dundee e acreditem se quiser, Cruz de Ferro!!!

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  6. Como é o trabalho dessa distribuidora Lume?

    Geralmente o catálogo dessas distribuidoras menores são caríssimos e o trabalho realizado no disco é bem ruim. Eu ia comprar Nightbreed do Clive Barker pela Magnus Opus, só que quando vi o preço e um amigo me emprestou o DVD é vi o trabalho porco que tinha sido feito desisti na hora.

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  7. Magnus Opus = Continental

    Não compre nenhum DVD desses malas, como você mesmo notou são caríssimos e a qualidade muitas vezes é inferior às versões disponíveis na Internet. Isso quando eles não comprimem filme lançado em DVD-9 para caber em DVD-5.

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  8. Se brincar, eles baixam da Internet e convertem em DVD.

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  9. A faixa de preço da Lume é praticamente a mesma da Magnus Opus, se naõ estou enganado. Mas a qualidade do DVD é muito boa. O único problema é que não vem muitos extras, pelo menos nos que eu tenho aqui.

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  10. Lume = melhor selo

    Alfredo Garcia = obra-prima absoluta

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  11. Esse filme parece que virou o post da semana na maioria dos blogs. Ainda não vi, mas estou curioso (por se tratar de Peckinpah). O último do diretor que eu vi foi O Casal Osterman. Extraordinário por sinal!

    Cultura? O lugar é aqui:
    http://culturaexmachina.blogspot.com

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  12. Procurem no youtube a animação "Bring Me The Head Of Charlie Brown", que tem referências a ALFREDO GARCIA, THE WILD BUNCH e TAXI DRIVER. Muito bom!

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  13. fala Perrone, tava meio sumido mas to de volta, esse filme do Peckinpah é demais e você soube falar muito bem sobre o inferno pessoal do cineasta, infelizmente esses produtores dominaram o mercado cinematografico, mas ainda temos este cineasta rebelde que sempre será lembrado

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  14. Grande filme. Um dos melhores do realizador. Infelizmente não o encontrei ainda no circuito DVD Português.

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  15. Não acredito que não comentei isso aqui! Um belo texto que exprime com fidelidade a insanidade que Peckinpah realiza em Alfredo Garcia. É talvez seu grande suspiro antes de sucumbir de vez ao alcoolismo e loucura, e é uma boa e velha balada de um homem sem lei que busca, mata e corre em nome de algo quase que inominável. Seus diálogos com a cabeça cheia de moscas ilustram bem isso, numa tentativa desesperada de um homem que martela e cava (por meio de balas e violência) na busca de algo que seja. Algo que o complete, que o faça entender no que se meteu. Lindo, poético, visceral: obra prima, com certeza!

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