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8.9.13

O ANO DO DRAGÃO (Year of the Dragon, 1985)


Fui intimado por um fiel leitor, que se apresenta apenas como Jorge, a escrever sobre O ANO DO DRAGÃO, do Michael Cimino. Então cá estamos. Só havia assistido uma única vez há muitos anos e desde então ficara marcado na minha memória como um dos grandes exemplares do gênero policial dos anos 80. Revisitei-o esta semana e me descobri diante de algo muito maior, uma obra cinematográfica poderosíssima em todos os sentidos possíveis. Já imaginava que isso fosse acontecer. O cinema de Cimino é grande e, numa revisão, O ANO DO DRAGÃO só poderia resultar em mais de duas horas de encantamento cinéfilo. Quem ainda tem dúvidas de que Cimino foi (ou "é", já que não morreu ainda, embora não realize um longa há quase vinte anos) um dos maiores cineastas americanos da história precisa olhar seu trabalho mais de perto...


A excelência do roteiro do próprio Cimino (em parceria com Oliver Stone) em O ANO DO DRAGÃO é inegável e possui muito do repertório temático presente na carreira do homem, como a América traumatizada pela tragédia que foi o Vietnã, a obsessão precisa por celebrações, o cuidado nos mínimos detalhes com os personagens, por exemplo, o protagonista, o capitão da polícia Stanley White, encarnado por Mickey Rourke. Um ex-combatente do Vietnã que transforma as ruas de Chinatown num autêntico campo de guerra contra a máfia chinesa. O papel foi oferecido para Nick Nolte e Jeff Bridges, mas após assistir a THE POPE OF GREENWICH VILLAGE, Cimino achou o ator perfeito para seu filme.

E é realmente difícil enxergar outro sujeito no lugar de Rourke, que conseguiu compor um retrato complexo e expressivo para o seu personagem. Um herói com profundas convicções em relação ao seu trabalho, mas bruto no trato com a bandidagem, capaz de ultrapassar os limites da ética profissional quando a missão é prender meliantes, além de ser um tremendo canalha com as pessoas ao seu redor. Não tenho receio em dizer que se trata do grande desempenho da carreira de Rourke. O elenco ainda tem John Lone, como a principal pedra no sapato do protagonista, Victor Wong, Raymond J. Barry e Ariane, uma modelo de traços orientais que tentou virar atriz... Ela é fraca, mas sua atuação não compromete. Alguns anos depois tentou novamente e apareceu em O REI DE NOVA YORK (90), do Abel Ferrara.


O ANO DO DRAGÃO é o primeiro filme de Cimino após o fiasco comercial de O PORTAL DO PARAÍSO, que resultou na falência da produtora United Artists, mas que gerou uma das mais impressionantes obras primas que o cinema foi capaz de criar. Aparentemente, este aqui possui pretensões mais modestas, preso às convenções do gênero policial, mas acompanhar o desenrolar da trama e a evolução do personagem de Rourke é contemplar a visão de mundo de um artista subestimado, mas simplesmente genial, e sua fascinação pela técnica cinematográfica, mantendo o filme num nível de qualidade altíssimo. Basta ao espectador ficar observando a composição dos inúmeros planos, a gestão dos espaços cênicos e a maneira virtuosa como Cimino movimenta a câmera durante todo o filme para ficar hipnotizado, além de se ter a medida exata do talento sobrepujante do último dos mavericks. Nisso inclui, claro, belas e violentas sequências de ação. Ainda prefiro VIVER E MORRER EM LA, de William Friedkin, como o grande filme policial daquele período. Mas O ANO DO DRAGÃO é um páreo duríssimo e não fica muito atrás.

21.12.12

A MÃO (The Hand, 1981)


Nas palavras do próprio Oliver Stone, “Eles tentaram me derrubar como diretor, mas eu retornei como roteirista”. Seja lá quem são “eles”, Stone estava se referindo ao período após a sua traumática estreia na direção (e que eu tentei explicar aqui) quando havia desistido de fazer filmes e passou apenas a escrevê-los. Finalizou quatorze roteiros em poucos anos, entre eles O EXPRESSO DA MEIA NOITE, que lhe rendeu um Oscar de roteiro adaptado.

Com um prêmio da Academia na prateleira, Stone voltou a pensar na possibilidade de dirigir. Nesse período, os roteiros de PLATOON e NASCIDO EM 4 DE JULHO já estavam prontos, mas os seus financiadores não queriam produzir algo que competisse com o sucesso de APOCALYPSE NOW, do Coppola, e O FRANCO ATIRADOR, do Cimino. Sem poder dedicar-se aos seus projetos pessoais, Stone conseguiu 6,5 milhões para fazer algo menos ambicioso.

Ambição, no caso, é algo relativo. Um Spielberg ou George Lucas, naquele período, com “míseros” 6 milhões, com certeza deveriam conter a ambição. Já o pobre Oliver Stone, coitado, levando em conta que iria ainda dar início ao seu segundo filme, estava com grana pra cacete! Teria um mundo de possibilidades para trabalhar. E aí? O que o sujeito me faz? Um outro filme de horror…

Não que o gênero seja um problema. Até prefiro, como vocês sabem. Fico apenas imaginando os motivos pelos quais um indivíduo que se tranformaria numa espécie de ativista político em forma de diretor de cinema; que havia acabado de escrever roteiros dramáticos que tratam de traumas da guerra do Vietnã; que acabara de ganhar um Oscar por um roteiro considerado sério e relevante; que era uma das grandes promessas entre os roteiristas da época; que havia passado por uma experiência desastrosa com o gênero; se interessaria em contar a história de uma mão decepada assassina?

Ok, ao término da sessão percebi as intenções de Stone. A MÃO (em portugal A GARRA) não é como um terror/slasher qualquer jogado entre os milhares que brotavam durante os anos 80. Trata-se de um horror psicológico que estuda um personagem, procura entender seus atos, analisa sua maneira de pensar diante das transformações que lhe ocorrem a partir de um trágico acidente. E não estou falando da mão que o título do filme se refere e que resolve agir por conta própria, saindo por aí apertando os pescoços alheios. Estou falando do desenhista de história em quadrinhos Jonathan Lansdale, que em dado momento perde a mão num acidente de carro. Bizarros acontecimentos passam a acontecer a partir de então, inclusive alguns assassinatos.


Mas essas mortes aconteceram? Ou são frutos da imaginação do protagonista? Se realmente aconteceram, existe uma força sobrenatural que controla a mão decepada? Ou o desenhista é o assassino, já que as vítimas são sempre seus desafetos? A MÃO termina de maneira ambígua em relação a algumas dessas questões, exigindo que o espectador permaneça com o filme na cabeça após a sessão. O que visualmente Stone mostra nas cenas de suspense e assassinato é, realmente, o “ponto de vista” de uma mão fora do corpo, invocada, sedenta por sangue.

A primeira escolha para viver o sr. Lansdale era Jon Voight, que acabou recusando. Dustin Hoffman também não quis saber de ficar rolando no chão com uma mão de látex. Agora, uma das escolhas recusadas caberia ao personagem como, sem ironia, uma luva! Christopher Walken! Acabou parando em Michael Caine mesmo, que faz o trabalho com toda segurança do mundo! Em uma entrevista para a TV, o ator disse que só aceitou o papel porque naquele momento precisava de dinheiro para construir uma garagem nova… não sei se isso demonstra um desdém pelo filme, mas acho que não, pois, algum tempo depois ele foi visto em TUBARÃO – A VINGANÇA. Devia mesmo estar passando necessidade…

No entanto, se temos algum motivo para não desgrudar os olhos da tela é o ótimo desempenho de Caine. Um pouco histérico em alguns momentos, mas muito expressivo e apropriado na medida com o tom do filme. Stone diz maravilhas por ter trabalhado com o ator. Como eu disse anteriormente, A MÃO tem uma faceta psicológica e quem carrega essa carga é Caine, que trabalha cada nuance de seu personagem, em especial as transformações que sofre, passando do homem comum, apesar de alguns problemas conjugais (o que não deixa de ser algo comum), ao maníaco psicótico assassino. Um desempenho incrível.

Por esse tratamento já dá para notar que o filme não descamba para o simplório plot da “mão assassina”. Stone mantém o foco no drama do personagem, nas questões dos seus transtornos familiares, na incapacidade de realizar seu trabalho, na maneira como precisa se acostumar com uma prótese mecânica e com a mudança de emprego, ou quando começa a se relacionar sexualmente com uma de suas alunas. E como tudo isso gradativamente vai perturbando a mente do sujeito. E é isso que manteve meu interesse pelo filme.


Seria nada menos que ridículo se A MÃO fosse pelo caminho mais fácil do terror do absurdo e exagerado, dando ênfase somente a uma mão que mata, apesar do genial trabalho do mestre Carlo Rambaldi na criação dos efeitos especiais, da mão mecânica (e que na tela tem resultados incríveis!). A luta final entre o protagonista e o membro, por exemplo, é interessante se você comprar a ideia extravagante que Stone propõe. E me fez lembrar EVIL DEAD II…

De alguma maneira, A MÃO possui laços muito bem definidos com SEIZURE. Em ambos, os protagonistas são artistas cujas alucinações insanas diretamente ligadas aos seus respectivos trabalhos ganham vida própria e praticam o mal. Mas as inspirações de Stone neste aqui partiram de duas fontes: o romance de 1979 The Lizard's Tail, de Marc Brandell e um filme de 1946 estrelado pelo Peter Lorre, OS DEDOS DA MORTE, dirigido por um senhor chamado Robert Florey.

Cinco anos depois, Stone lançaria sua obra prima. Não, não estou falando de PLATOON, lançado no mesmo ano de 1986 e que abocanhou um monte de Oscars. Me refiro a SALVADOR, com James Woods. É o meu favorito do homem, que na verdade, está longe de ser dos meus diretores de cabeceira, mas sempre me despertou interesse. Com o lançamento de SELVAGENS há alguns meses, resolvi tirar o atraso com alguns de seus filmes que eu ainda não tinha visto, como JFK, que achei bom, um trabalho de reconstituição de época preciso, interessante, apesar do Stone romantizar demais as coisas; e TALK RADIO que é excepcional, e a atuação do Eric Bogosian é uma das mais fenomenais daquele período do cinema americano.

Aqui vai um top 10 do diretor, caso tenham curiosidade:

10. NASCIDO EM 4 DE JULHO(1989)
09. REVIRAVOLTA (1997)
08. THE DOORS (1990)
07. UM DOMINGO QUALQUER (1999)
06. WALL STREET (1987)
05. JFK (1991)
04. A MÃO (1981)
03. PLATOON (1986)
02. TALK RADIO (1988)
01. SALVADOR (1986)

Pronto. Chega de Oliver Stone por um bom tempo…

11.12.12

SEIZURE (1974)


SEIZURE é o primeiro longa de Oliver Stone e encontra-se à milhas de distância do tipo de cinema que o sujeito faria ao longo da carreira. Ao contrário dos dramas políticos, traumas de guerra, ou tratados sobre a violência, o que temos aqui nada mais é que um exemplar de horror organicamente inserido no contexto do gênero feito nos anos 70. Um bocado pretensioso e bastante problemático no que cerne à narrativa, ao ritmo e etc, como é de praxe quando se trata do trabalho inicial de um cineasta sem muita experiência. Mas nada melhor que um filme seminal de um diretor hoje consagrado para descobrir algumas histórias de bastidores.

Após retornar do Vietnam, em meados dos anos 60, Stone resolveu aliar sua habilidade na escrita com algo que nunca havia experimentado antes: o cinema. Entrou para NYU film school e teve como professor um sujeitinho de sobrancelhas grossas que faria uns filmes “razoáveis” como TAXI DRIVER e TOURO INDOMÁVEL… Nessa época, Stone chegou a realizar um curta metragem, muito bom aliás, LAST YEAR IN VIETNAM, o qual recebeu vários prêmios em festivais estudantis. Com este curta no currículo e mais a bagagem adquirida na universidade, Stone partiu para o Canadá com o propósito de realizar seu primeiro longa metragem.


Juntamente com um amigo, Jeff Kapelman, que foi um dos produtores de SEIZURE, Stone foi em busca de investidores. Os problemas começam por aí. Não demorou muito para arranjarem cerca de cento e cinquenta mil dólares, que é uma boa grana para um primeiro e pequeno filme de horror. A questão é que um dos produtores era Michael Thevis, um gangster novaiorquino que utilizava seus investimentos no mercado da música e do cinema para fazer lavagem de dinheiro. Portanto, não seria surpresa para quem já conhece um pouco da vida do diretor, sua visão política e sua afetuosa ligação com entorpecentes, constatar que seu primeiro filme foi feito com dinheiro sujo da máfia. Aliás, nada mais óbvio em se tratando de Oliver Stone.

Mas isso não serve de desculpa para a má administração que esse dinheiro acabou recebendo. Talvez pela falta de experiência Stone gastou mais que devia, sei lá... sabe-se apenas que o diretor, em pleno début, se viu no meio das filmagens com os atores fazendo motim por não terem recebido salário e reza a lenda que o anão Hervé Villechaize tentou negociar com Stone segurando uma faca… uma versão de Herzog vs Kinski em AGUIRRE, mas em miniatura.


Ao fim do torturante processo de filmagem, Stone precisou montar o filme às pressas no seu quarto de hotel ainda no Canadá e contrabandeou os negativos pela fronteira devendo rios de dinheiro. A ideia de Stone era ele próprio vender o filme, mas foi totalmente ignorado pelos distribuidores. Conseguiu finalmente vender para uma companhia ligada à AIP por um preço irrisório e teve uma cretina circulação comercial, da qual Stone demonstra desapontamento até hoje. Não é a toa que essa experiência traumática o afastou da direção por vários anos. Em 1981 a coragem voltou e ele fez A MÃO. Ainda bem.


Rapidamente sobre o filme. SEIZURE realmente não é lá grandes coisas, mas tem momentos e ideias interessantes. A trama transcorre num fim de semana, na casa de campo de um escritor (Johnathan Frid, o Barnabas Collins original) que recebe alguns convidados. Os problemas começam quando as criações mentais do protagonista, figuras macabras (uma gostosona chamada Queen of Evil; um grandalhão deformado com roupa de carrasco; e Spider, um bizarro anão), tomam vida e começam a aterrorizar os personagens. O elenco é excelente e Stone demonstra boa capacidade em criar climas surreais, atmosféricos e sequências mais intensas, como a que o protagonista é obrigado a encarar uma luta de facas com uma de suas convidadas. Só peca mesmo pela falta de noção de ritmo e por conta de uma exagerada pretensão psicológica. Se leva à serio demais. Não deixa, no entanto, de ser um bom filme de horror.

Nos tempos áureos do VHS, durante os anos 80, SEIZURE foi lançado no mercado americano com o título QUEEN OF EVIL. É bem pouco comentado… talvez até tenha sido pouco visto. Como não foi lançado em DVD, deverá continuar assim por um bom tempo ainda.

23.9.12

SELVAGENS (2012)

Cá estou em Portugal já faz quase duas semanas e finalmente atualizei o recinto! Cheguei agora há pouco da minha primeira sessão de cinema por aqui e, infelizmente, preciso concordar com o amigo Alucard, que havia suspeitado no último post que o circuito comercial daqui era pior que o do Brasil. Digamos que ambos são a mesma porcaria, mas, por exemplo, SELVAGENS, novo trabalho do veterano Oliver Stone, ainda não estreou em terras tupiniquins, enquanto o novo filme do Woody Allen só chegou por aqui neste fim de semana. Então, tudo na mesma... A sala era boa, com poltronas muito confortáveis e curiosamente TODAS as sessões possuem intervalo no meio da projeção. Não sei se isso é bom ou ruim, mas pelo menos fui ao banheiro sem perder um pedaço do filme…


Sobre SELVAGENS, não é nada sensacional, mas é um Stone em boa forma, o que pra mim é muita coisa. Confesso que desde aquele dejeto chamado WORLD TRADE CENTER eu não vi mais nada do homem. E foi por esquecimento mesmo, até queria ter visto W e o novo WALL STREET, mas foi passando o tempo e nada… Agora o Stone resolveu voltar suas câmeras para o submundo do crime, das drogas, aí não tinha escapatória. Os protagonistas são dois traficantes independentes da Califórnia que dividem a mesma mulher e isso é o que há de melhor em SELVAGENS. Em certo momento, a mocinha diz que são como BUTCH CASSIDY & SUNDANCE KID, mas eu prefiro remetê-los a uma espécie de JULES E JIM do tráfico. Só que ao invés de provocar, o diretor trata a relação à três com uma delicadeza absurda. E quando Stone acerta, nem que seja em pequenos detalhes, é imbatível. O trio se mete numa enrascada das boas quando o cartel mexicano decide “propor uma parceria”. É o mote para o diretor expor sem dó nem piedade uma profusão de violência, tensão, cheio de personagens interessantes, como o vivido por Benício Del Toro, um assassino cruel à serviço do cartel; ou John Travolta, na pele de um federal corrupto. E de quebra, temos ainda Salma Hayek como rainha mexicana das drogas.

Contextualizando na filmografia do Stone, digamos que SELVAGENS se alinha esteticamente a ASSASSINOS POR NATUREZA, REVIRAVOLTA, essas realizações mais viajadas visualmente, com planos em preto e branco, outros com tonalidades fortes, fusões de imagens, etc, mas sem exagerar em demasia. A direção tem a energia usual dos seus melhores filmes, mas o resultado final não tem calibre suficiente pra tanto. Tem lá suas parcelas de problemas, mas do jeito que ficou, não tenho do que ficar reclamando.