OS MERCENÁRIOS não é simplesmente um filme de ação. Representa muito mais que isso para uma geração que cresceu assistindo aos exemplares do gênero nos anos 80, os bons e velhos anos 80, como os RAMBO’s, COMANDO PARA MATAR, INVASÃO USA, DURO DE MATAR, e milhares de outros títulos onde reinava o exagero, a violência e a truculência de personagens valentões e politicamente incorretos, que matavam e torturavam sem piedade, sem se importar com a quantidade de inimigos que enfrentavam. E ainda por cima, fazendo pose pra câmera... afinal, eles eram os “
good guys” que nunca seriam alvejados e suas balas não iriam acabar.
Essa mesma geração acompanhou de perto o que o gênero se tornou com o passar do tempo. O cinema de ação feito hoje para a moçada é vergonhoso, feito por gente sem o mínimo de talento e bom senso em comparação com os diretores de saco roxo de 25 anos atrás. Ainda há um grupo remanescente que de vez em quando apresenta algumas pérolas, quase sempre no cenário independente, lançados diretamente em DVD, como Isaac Florentine, John Hyams e Jesse V. Johnson.
Até ontem, meu filme de ação preferido de 2010, era o pequeno THE BUTCHER, do citado Johnson, um excelente exemplar feito à moda antiga estrelado pelo Eric Roberts. Disse até ontem porque após o monumental
OS MERCENÁRIOS fica difícil a disputa pelo posto de primeiro lugar. O filme de Stallone come a concorrência no café da manhã com rosquinhas e leite! Fazendo um papel de porta voz em nome dos fãs do cinema de ação da minha geração, não tenho medo de arriscar ao dizer que
OS MERCENÁRIOS é um acontecimento histórico, um retorno ao coração dos anos oitenta, ao exagero frenético e explosivo da mais pura ação, onde a trama não importa, as atuações muito menos, apenas o efeito catártico sobre o espectador obtido através do espetáculo visual e sonoro é o que realmente conta. E é o que temos de sobra por aqui.
Além, é claro, da reunião “
aldrichiana” do elenco formado por alguns personagens ícones do cinema de ação e que serviu de isca para a campanha promocional do filme. Alguns atores nem chegam a ter tanto
status, mas estão tão bem inseridos nesse universo, que a impressão é a de que sempre estiveram lá, participando daquele período mágico. E apesar de toda brutalidade, a contagem de corpos e violência exacerbada, é preciso muita sensibilidade para realizar um filme como este. Stallone não é nenhum ignorante e sabe muito bem o que o cinema de ação
mainstream tem se tornado ao longo do tempo. Em RAMBO 4, por exemplo, ele já tinha jogado na tela: “FILME DE AÇÃO É ISSO AQUI, CA@#$LHO!!!”. A segunda aula de cinema é agora, com
OS MERCENÁRIOS.
Não se trata de um filme perfeito. Estou prevendo muita gente apontando o dedo em alguns problemas, alguns excessos... normal. Mas quem entrar no cinema disposto a ver muita, mas muita explosão, tiros e alta contagem de corpos, vai ser muito bem recompensado. Eu me senti como se tivesse doze anos. Foi uma experiência única. Nunca vi tanta pirotecnia numa sala de cinema em toda minha vida!
E Stallone provavelmente se estabelece agora como o grande nome do cinema de ação americano da atualidade. Mais por manter o espírito do gênero da maneira que deve ser: anacrônico, sem firulas e bem exagerado. É até curiosa as sequências de ação, pois são filmadas e montadas como uma máquina de costura, com excesso de planos e cortes acelerados, da maneira que nós acostumamos a criticar, mas o espectador consegue perfeitamente ver o que se passa na tela. Domínio total da gramática da ação do velho Stallone mesmo chacoalhando a câmera. A única cena que esse tipo de recurso estético deveria ter sido modificado para uma montagem menos acelerada e enquadramentos mais clássicos é na luta do Jet Li contra o Dolph. O resultado não favorece o oriental, que poderia ter suas habilidades e a beleza dos seus movimentos melhor aproveitadas.
A trama básica que já estamos carecas de saber permanece com poucas surpresas. Grupo de mercenários contratado para derrubar um ditador num país sul americano. Até na premissa Stallone foi buscar lá atrás, em filmes como CÃES DE GUERRA e MCBAIN. A história pode até ser bem simples, mas é com as situações cheia de testosterona e os personagens carismáticos que
OS MERCENÁRIOS realmente ganha um corpo.
Não vou falar de cada ator, mas todos eles mereceriam um parágrafo só pra eles. Todos têm a sua peculiaridade muito bem trabalhada, ainda que de forma sutil. TODOS estão muito bem, com a impressão de que se divertiram muito fazendo esse filme. Isso fica claro na encenação, nos diálogos, alguns parecem improvisados, mesmo que a atuação de alguns não seja grande coisa, mas cumpriram muito bem seus papéis.
Meus destaques ficam por conta de 1) Mickey Rourke. Há uma cena belíssima onde ele relembra os velhos tempos com as lágrimas nos olhos que me deixou arrepiado. Dessas cenas que tornam um filme desses em algo muito maior do que aparentemente deveria ser. 2) Eric Roberts como vilão está sensacional. Bem caricato e eficiente. Como é bom vê-lo na tela grande tão a vontade. 3) Outro que me surpreendeu foi o velho Dolph!!! Quase todos os atores que se envolvem na ação tiveram o trabalho de interpretar a eles mesmos ou as representações que os transformaram em ícones. Dolph não. Foi um dos únicos que precisou encarnar um personagem bem diferente do que faz, na pele de um abobalhado alucinado, louco, psicopata! É meu personagem favorito.
E há ainda o encontro dos ícones máximos! Não vou entrar em detalhes para não estragar o prazer de quem ainda não viu, mas Stallone, Bruce Willis e Arnoldão juntos é antológico! Um dos melhores momentos do filme.
JET LI x DOLPH LUNDGREN
Como já disse, um detalhe que eu encrenquei foram as lutas do Jet Li filmadas de maneiras picotadas. Não sei, mas acho que Stallone busca realismo com esse tipo de edição. Mas cada personagem é apresentado com uma habilidade especial e várias delas com o pé no exagero. Stallone rápido no gatilho com um revólver à moda antiga, Stathan é hábil com facas e por aí vai. Não custava nada o Jet Li demonstrar suas habilidades da maneira correta de se filmar
kung fu. Enfim, acho que o grande e esperado duelo entre ele e o Dolph ficou um pouco prejudicado por conta disso, mas ainda assim achei bacana e muito bem contextualizado.
SYLVESTER STALLONE x STEVE AUSTIN
Essa aqui foi melhor. No calor da ação final, Stallone atraca com Austin num quebra pau pra lá de truculento num túnel. Aí sim, quando dois brutamontes trocam murros, o resultado na tela é bem melhor da forma que ficou. E Stallone dando golpes de MMA é sensacional! Aliás, toda a sequência que acontece dentro dos túneis nos subterrâneos da mansão do ditador é de deixar qualquer fã do gênero com um sorriso de orelha a orelha durante muito tempo. Gary Daniels levando uma surra de Jet Li e Stathan é uma coisa linda e Terry Crews destruido com sua metralhadora é a cena mais "puta que pariu" do filme.
GISELE ITIÉ
Delícia!
OS MERCENÁRIOS se confirma como o filme de ação absurdo, violento e oitentista que eu esperava ansiosamente. E Stallone é dos poucos diretores americanos que devolve o prazer por este gênero que eu tanto aprecio. Seu trabalho aqui é bem mais que uma homenagem aos bons tempos do gênero. É quase um autêntico exemplar daquele período, mas calhou de aparecer na hora errada, só que deveria servir de paradigma para todo e qualquer cidadão que resolvesse se aventurar com o cinema de ação na atualidade.